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O Museu do Negro, localizado na Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, no centro da cidade do Rio de Janeiro, é um espaço dedicado à representação histórica do negro no Brasil, sua religiosidade e devoções.
Misto de museu e de espaço sagrado, o Museu do Negro, gerido pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, fundada em 1640 fundada por negros alforriados e escravos, tem a peculiaridade de abrigar em seu acervo objetos de culto ligados às práticas e devoções dos fiés.
Neste museu, classificado como um “Museu-devoção” (PAIVA, 2009, p. 119) o caráter devocional primeiro, emanado dos objetos de culto expostos, ensejam a reflexão sobre a “categoria ‘patrimônio’, tal como representada do ponto de vista dos devotos. [...] narrativas que envolvem as relações sociais e simbólicas entre o espaço do museu, o espaço religioso e a cidade” (PAIVA, 2007, P. 2).
“Museu dos Escravos”, “Museu da Abolição” e “Museu do Negro” - um lugar de trocas simbólicas
As diferentes denominações já atribuídas ao museu são reveladoras das trocas simbólicas, das tensões e dos confrontos que interligam narrativas, práticas e representações religiosas distintas.
A própria história da institucionalização do museu nos chega por meio de hipóteses construídas a partir de narrativas colhidas em estudo antropológico sobre as práticas e as representações religiosas na Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, no Rio de Janeiro:
“É curioso o fato de que muitos ‘irmãos’ situam a existência do museu após o incêndio, como se este evento consistisse em condição para sua criação. Entretanto, diante das variadas formas de nomeação empregadas, torna-se difícil determinar a data de surgimento de cada uma das classificações do museu [...]. Talvez pensar por que são colecionados determinados objetos – e não outros – e os modos de interação com eles possibilite um entendimento dessa questão, visto que o colecionamento traduz o processo de formação da categoria ‘patrimônio’” (PAIVA, 2009, p. 87-88 ).
Desse modo, é possível observar no Museu do Negro tanto o culto aos santos e entidades como Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e a Escrava Anastácia quanto à memória de Zumbi dos Palmares, da “Redentora”, a Princesa Isabel, e do movimento abolicionista.
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Espaço Físico: prédio, território e entorno
O Museu do Negro está instalado na Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, patrimônio da cidade do Rio de Janeiro, bem tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1938.
A igreja, erigida na antiga Rua da Vala, hoje Rua Uruguaiana, é um local de afirmação identitária para a comunidade de negros da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos da cidade do Rio de Janeiro.
A história de sua construção remonta à iniciativa dos confrades da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos que, anteriormente, tinham como lugar de abrigo e culto de suas imagens um dos altares da antiga Igreja de São Sebastião localizada no Morro do Castelo. Por motivo das desavenças entre a irmandade e os cônegos da Velha Sé do Bispado do Rio de Janeiro, ali instalada, em 1684, decidiram os irmãos retirarem de lá suas imagens e construir sua própria igreja. O que só foi possível, graças a uma das devotas do Rosário, Francisca Pontes, que havia doado à irmandade umas terras situadas na Rua dos Latoeiros, à beira da Vala, lugar de pouco valor.
Com sua construção iniciada no ano de 1700, levou 25 anos para ser terminada. Entre 1737 e 1808, abrigou, a contragosto da irmandade e muitas desavenças, a Sé e o Cabido.
Por essa razão, foi a igreja da cidade a receber a visita de agradecimento feita por D. João VI e a Corte Portuguesa, pelo êxito da chegada ao Rio de Janeiro, em 1808. Fato a acrescentar mais um capítulo nas históricas desavenças e disputas entre a Irmandade do Rosário e os Cônegos da Sé.
“Os Cônegos decidiram receber na porta do Templo os ilustres visitantes reais, em detrimento dos membros da Irmandade. Após muita discussão, os Irmãos simularam conformar-se com a vontade dos ‘hospedes’ e se retiraram da Igreja. Entretanto, ficaram nas redondezas e, ao se aproximar o Cortejo Real, postaram-se na porta do Templo. O Séquito do soberano e fidalgos teve que desfilar entre as alas dos negros irmão. Foi essa a última desavença, pois em 15 de julho de 1808, a Sé deixava aquela Igreja” (CARVALHO, 2009, p.93-94).
Quando da volta da família Real para Lisboa, em 1821, foi no Consistório da Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos que passou a funcionar o Senado da Câmara, razão pela qual foi o palco de importantes eventos ocorridos às vésperas da Independência do Brasil como a redação da representação popular dirigida a D. Pedro que culminou no "Dia do Fico". Depois de 1824, com a saída do Senado das dependências da igreja, o Consistório passou a ser ocupado pela Imperial Academia do Reino. No templo repousam os restos mortais do Mestre Valentim.
Germain Bazin, autor de Arquitetura Religiosa Barroca no Brasil, descreve a igreja como um edifício interessante em razão de “seu plano muito alongado, com a capela-mor profunda e corredor em apenas um lado (Evangelho)” (BAZIN, 1956, p. 154). Relata ainda que a capela-mor e a igreja foram reformadas no ano de 1772 e, um ano depois, a capela-mor foi reformada. “Outras restaurações importantes ocorreram no século XIX, época em que foi reconstruída a fachada” (idem)
Após o incêndio ocorrido na noite de 25 de março de 1967, subsiste a fachada com as duas torres, a portada maneirista de pedra de Lioz e parte das paredes da nave e da capela-mor. Com toda decoração barroca destruída, seu interior foi reconstruído em linguagem modernista, com projetos de Lúcio Costa e Sérgio Porto, sendo reaberta ao público em 1969.
O destaque fica por conta do “renque de sobrados comerciais inserido no corpo da construção religiosa - único exemplar da cidade” (PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, 2000, p. 68).
Hoje, seu interior apresenta sete altares laterais, além do altar-mor em que se vê o Cristo Crucificado. Dois corredores, em dois planos, levam à sacristia, ao Consistório e às dependências da irmandade, onde se encontra o Museu do Negro. No primeiro piso, um ossuário com velas votivas.
Instituição: trajetória e natureza jurídica
O Museu do Negro é uma instituição privada, vinculada à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos.
A trajetória da instituição remonta à época de reconstrução da igreja, em razão do incêndio de 1967. A criação do museu associa-se à luta pela recuperação, legitimação e preservação da memória da igreja e da irmandade dos negros:
“O incêndio iniciado na noite de 25 de março de 1967 se alastrou pela madrugada do dia seguinte, domingo de Páscoa, e ele não apenas destruiu a igreja mas arruinou registros. De acordo com alguns membros da irmandade, eles seriam as “provas” que legitimavam a importância da igreja, da irmandade do período colonial brasileiro na memória nacional, pois tratava-se de documentação acerca do período da escravatura, referentes ao cotidiano e aos costumes urbanos. Parte desses documentos (dentre eles, registros tributários e livros de matrícula) já havia sido queimados em 14 de dezembro de 1890, por ordem de Rui Barbosa, abolicionista e ministro da república (PAIVA, 2009, P.55).
Na placa afixada ao lado da antiga entrada do museu se lê: “Museu do Negro fundado em 1969”.
O acervo do Museu do Negro é composto por esculturas, fotografias, indumentária e documentos, dentre outros, com destaque para as santidades católicas, paramentos litúrgicos e dos membros da irmandade; os objetos ligados à escravidão (instrumentos de suplício e do cotidiano); objetos de culto ligados ao Candomblé, imagens e indumentária representativas da africanidade, da “Mãe África e da “Mulher Negra”; objetos ligados ao Movimento Abolicionista e à Monarquia como dois estandartes abolicionistas salvos do incêndio, utilizados na procissão de despojo dos ossos da Princesa Isabel e do Conde D’Eu, na década de 1970.
ARAÚJO, Eduardo Jenner Farah de. (Coord.). Os museus do Rio que poucos conhecem. Rio de Janeiro: [s.n.], 1978. 84 p.
AZZI, Riolando. O catolicismo popular no Brasil: aspectos históricos. Petrópolis: Vozes, 1978.
CARVALHO, Orlindo José de. Templos Católicos do Rio de Janeiro – Manual. Editora Vozes, 2009.
IMPERIAL IRMANDADE DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO E SÃO BENEDITO DOS HOMENS PRETOS. Museu do Negro. Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos. Rio de Janeiro: Imperial Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos, [2007?]. Não paginado. Folder informativo.
INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL. Arquivo Noronha Santos. Igreja do Rosário e São Benedito (Rio de Janeiro, RJ). Disponível em: http://www.iphan.gov.br/ans/inicial.htm. Acesso em: 22 de jan. 2013.
INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS. Guia dos museus brasileiros. Brasília: IBRAM, 2011. 592 p. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wp-content/uploads/2011/05/gmb_sudeste.pdf. Acesso em: 14 set. 2011.
PAIVA, Andréa Lúcia da Silva de. Museu dos Escravos, Museu da Abolição: o Museu do Negro e a arte de colecionar para patrimoniar. In: ABREU, Regina; CHAGAS, Mário de Souza; SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. (Org.). Museus, coleções e patrimônios: narrativas polifônicas. Rio de Janeiro: Garamond; MINC; IPHAN; DEMU, 2007. p. 203-228. (Coleção Museu, Memória e Cidadania).
_______. Os Devotos e a Cidade: colecionamento, devoção e patrimônio em um museu no centro do Rio de Janeiro. Trabalho apresentado na 26ª REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA - ABA, 26ª, 2008, Porto Seguro. Grupo Temático 15: Cultura popular, patrimônio imaterial e cidades. Porto Seguro, 2008.
______. Os Fios do Trançado: Um estudo antropológico sobre práticas e representações na Igreja Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos no Rio de Janeiro. 2009. 266 f. Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
PARTIDO DA CAUSA OPERÁRIA. A opressão do negro passa pela destruição da sua cultura. Situação de museu sobre negros ilustra segregação social. São Paulo: PCO, 2004. Não paginado.
QUESTÕES NEGRAS. Quem não ama Zumbi? [S.l.]: Questões Negras, 2011. Não paginado.
RIBEIRO, Paula. Saara, tradicional espaço de comércio no Centro do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: SESC Rio, 2003. Não paginado.
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